Salto No Tempo
São Gonçalo Sexta Feira 13 De Agosto De 1982
A uma menina muito especial
Oi menina! Faz tempo que penso em escrever-lhe, e você até pode pensar que eu não escrevi para você antes por que eu não quis. Não a culpo e aqui me desculpo, escrevendo-lhe tudo o que neste dias estive a pensar, a observar, a sonhar, desejar e também a sofrer... Todas estas coisas que escrevo, estão a me sufocar o peito, a queimar por dentro, se enraizando, crescendo em minhas entranhas, se expandindo em todas as direções, sugando-me a vida. E eu estou à muito, a espera de um momento mágico em que eu possa po-las à tona, transformadas em sinais gráficos totalmente submissas e perfeitamente alinhadas para uma melhor comunicação entre nós.
Tantas coisas eu pensei nestes dias, quantas coisas para conversar-mos, mas eu estava só! Sim eu estava só, perdido dentro de mim, enforcado nos meus grilos, escondido deste mundo, que a cada dia fica mais confuso no meu íntimo.
Puxa! Como é difícil escrever o que sinto agora, eu penso em algo, mas só consigo escrever coisas para lê-las de valor apenas subjetivo ao pensamento original, as coisas que eu queria dizer; não consigo registrar...
Um certo tempo depois...
São Gonçalo quarta feira 1° de Dezembro de 1982
A uma menina muito especial (continuação)
É, o tempo é muito relativo, três meses e meio separam estas linhas, uma eternidade se considerar-mos os milhares de segundos pingados como pingos de uma goteira de uma bica mau fechada. Mas aqui, no presente, ao reler o início do pensamento anterior, que não lhe enviei, descubro como mágica, como o tempo voa, e passa disfarçado de presente eterno aos nossos olhos e não nos apercebemos disso. E o triste, você reparará de como somos instáveis, distraídos e não senhores de nós mesmos e de como temos a tendência de esquecer coisas. Reparará que o nosso estado de espírito na época estava alerta sempre a cobrar um próximo bilhete, e que bastou passar N tempo para que nos esquecêssemos deste meio de comunicação.
Ao reler o pensamento anterior, o meu coração disparou, dando-me uma sensação de perda, de um longo período em coma, alheio ao tempo que passava de ausência enfim. Agora escrevo estas sem saber o que dizer, sem imaginar o grau de receptividade seu e se estou fazendo papel de tolo. Sabe? Neste tempo que passou, tantas coisas me aconteceram e nada escrevi, mas também você nada me cobrou e ao pegar nesta caneta agora, sinto como se eu estivesse me intrometendo no seu mundo, assim meio de sola, sem pedir licença. Talvez eu esteja enganado, mas realmente parece que estou sendo nostálgico, vivendo no passado. Se for o caso não tem problema, você me escreve dizendo e eu corto essa de escrever estas coisas sem pé nem cabeça! Ta legal?
MOVA 13/08/1982